segunda-feira, 1 de julho de 2013

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A vida como valor

OPINIÃO
A vida como valor
Albert Camus, escritor argelino do século passado, não via sentido na vida em face da morte, das doenças, das mais diversas situações de sofrimento, do mal irreparável e injustificável, por ser incoerente com a noção geralmente aceita de um mundo guiado por uma providência. Estávamos imersos no absurdo, ante o qual não restaria ao homem nada além de escolher entre o suicídio e a revolta, para, em seguida, descartar o suicídio como saída.
Camus viu o suicídio filosoficamente, mas o tema já foi abordado por várias disciplinas, como a sociologia, para a qual o fenômeno era próprio da vida em sociedade, uma constante, cuja variação era decorrente da maior ou menor gravidade de fatos sociais como guerras e revoluções, crises econômicas e outros. Uma porcentagem da população sucumbiria a tais infortúnios, em todos os tempos.
As religiões cristãs sempre viram no suicídio uma grave afronta a Deus, ao ponto de negarem aos suicidas nada menos do que a salvação, sua maior promessa aos fiéis. Em decorrência, ao longo da história negou-lhes também sacramentos como sepultamentos nos chamados campos santos. Com o florescimento do laicismo essas práticas foram abrandadas, sem contudo modificar os seus fundamentos.
O CVV, sigla de Centro de Valorização da Vida, instituição humanitária que atua na prevenção do suicídio há 50 anos no Brasil e 33 em Goiânia, encara a vida como valor e não como um simples fato da biologia, da sociologia, da antropologia ou até mesmo da psicologia. Também não pode encará-la exclusivamente do ângulo religioso ou da especulação filosófica. Sem negar que essas disciplinas, visões de mundo ou crenças são necessárias para dar conta do fenômeno humano, considera que elas não são suficientes. Em se tratando de ser humano, qualquer disciplina isolada, se ambicionar uma explicação total, parece sempre derivar para o reducionismo.
Para além das determinações naturais a que está submetido como qualquer ser vivo, o ser humano é dotado de particularidades muito específicas, pois encontra-se conscientemente imerso no drama de viver, o que resulta num mundo de emoção, conflito, desespero, mas também de esperança. Já se disse, com muita propriedade, que a distinção fundamental do humano deveria mudar, de racional, para simbólico. Mover-se num universo fluido de valores e símbolos e orientar-se por eles, parece, de fato, a nossa marca distintiva e inconfundível.
Um pai de família ou mesmo um jovem vestibulando que interromperam suas vidas pelo suicídio não fizeram uma escolha com base numa reflexão racional e fria sobre o sentido da vida, mas cederam ao emocional num momento de desespero, deixando para trás viúva, filhos e familiares desorientados e, por vezes, afetiva e materialmente desamparados. O gesto assume, dessa forma, imensa dramaticidade e desespero, assim como é quase sempre antecedido por comportamento ambivalente, que o leva a uma oscilação entre morrer e viver. É um drama humano, um gesto emocional e desesperado, que pode ser mudado a qualquer momento e não uma decisão racional.
Contrariando a crença de muitos, os suicidas, na sua grande maioria, não são portadores de algum tipo de doença mental, mas pessoas mentalmente sadias e momentânea ou temporariamente envolvidas em situações que julgam insuportáveis.
Comportamentos autodestrutivos podem ser potencializados com a aproximação de datas comemorativas como o Natal e o Ano Novo, datas em que as famílias se reúnem, o que pode infundir sentimento de exclusão entre aqueles que, ou não tem família ou convive mal com ela, elevando as tensões interiores e os sentimentos de solidão, tristeza e abandono. Muitos suicídios são atribuídos à depressão, que pode ser ocasional e não patológica, uma tristeza profunda mas passageira, podendo ser agravada nessas ocasiões comemorativas.
Para muitas pessoas que passam por um momento de depressão e têm esse sentimento suicida, o atendimento voluntário em instituições como o CVV é o único apoio. Neste caso, voluntários não profissionais ensejam uma interação baseada no respeito e na aceitação da diferença, na completa ausência de qualquer esforço no sentido de reduzir o outro ao mesmo.

Jesus José de Oliveira é fundador do Centro de Valorização da Vida (CVV) de Goiânia